Capítulo 9 - Quarentena
Acordo num pulo. Daniela, deitada, me olha.
- Pesadelo?
Afirmo com um aceno e deito novamente, afundando a cabeça no travesseiro. Não prego os olhos a noite inteira.
♦ ♦ ♦
De manhã, recebemos o café no quarto e, logo em seguida, somos levados para mais exames. No caminho, acompanhando Dra. Abigail, passamos por uma porta entreaberta onde percebo o que parece ser um... Corpo. Sim, um corpo sobre uma maca. Será? A sala está escura. Pode ser outra coisa.
A doutora recolhe mais amostras de nosso sangue, fios de cabelo, saliva. Nunca fiz exames parecidos. É tudo muito minucioso, sem explicações. Não trocamos uma palavra durante a quase uma hora que permanecemos ali. A senhora parece muito focada. Não olha em nossos olhos em nenhum momento.
♦ ♦ ♦
De volta ao dormitório, após nosso guia nos deixar, discutimos.
- É o seguinte! Não agüento mais ficar nessa ladainha de fazer exame, vir deitar, fazer exame, vir deitar... – fala Daniela, indignada. – Até quando vamos ficar confinados aqui?
- Concordo. – opina Ricardo. – Acho que o sangue de ontem foi o suficiente.
- Eu vi uma coisa. – digo. – Não tenho certeza, mas parecia um cadáver. Estava numa sala no fim do corredor.
- Que estranho. – indaga Ricardo. – Disseram que fomos os únicos sobreviventes.
- Talvez seja um dos zumbis. – arrisco.
- Para, Tiago! – Daniela me interrompe. – Não são zumbis. Zumbis são os monstros dos seus filmezinhos de terror. Isso é real. Eles estão infectados, estão doentes.
- Lá na cidade você não se importou de como eu os chamava enquanto te salvava.
Ricardo assobia alto e revira os olhos. Daniela não responde.
- Enfim, - continuo. – não tenho certeza absoluta de que era um corpo.
- Só tem um jeito de descobrir. – sugestiona Ricardo.
Sorrateiros, vamos pelo corredor vazio até a tal porta. Certificamo-nos de que não há ninguém por perto e entramos. A sala é escura e fria. Não há janelas nem entradas de ar. Quando a vista se acostuma à escuridão, percebemos uma silhueta. Um corpo desnudo sobre uma maca. É, eu não imaginei coisas. Ao redor, há portinholas de metal nas paredes. Parece um necrotério. Aproximo-me de uma delas e, lentamente, puxo. Outro corpo em seu interior.
- O quê vocês estão fazendo aqui?
Gritamos os três ao mesmo tempo com o susto. Abigail acendeu a lâmpada e não parece nada contente.
- Você... – gaguejo. – Você disse que só encontraram a gente.
- Como?
- É! Você disse que não encontraram outros sobreviventes além de nós. – questiona Ricardo.
- E quem disse que eles são sobreviventes? – pergunta Abigail.
- Ora... – procuro um argumento.
- Em primeiro lugar esses são alguns dos infectados abatidos. E em segundo, vocês não tem permissão para entrar onde bem entenderem. Vocês estão sob quarente... – ela se cala. Diante de nossos olhares desconfiados, respira fundo e continua. – É proibido entrar na maioria dos lugares aqui sem autorização, entenderam?
Assim que saímos do necrotério, Abigail tranca a porta e nos acompanha de volta ao quarto.
- Por favor, não banquem os rebeldes.
Assim que a ouvimos se distanciar, nos entreolhamos.
- Quarentena! – fala Daniela.
- O quê isso quer dizer? – pergunta Ricardo, confuso.
- Pelo que sei, quarentena se trata de isolar um indivíduo e segregá-lo do contato de outras pessoas para evitar que outras sejam infectadas. Mas nós não estamos doentes. Não entendo. Se estivéssemos sob quarentena, teriam nos prendido em outro lugar, e não nos deixariam vagar por aqui. – concluo.
- Bom, se não estamos em quarentena, estaremos em breve. Não acredito que nos deixarão sair daqui sem mais nem menos. Além do mais, nem temos pra onde ir. É muito mais cômodo pra esses filhos da mãe nos manterem presos. Ou nos matarem. – vocifera Daniela, alterada.
- Concordo. – diz Ricardo. – Eles não nos deixam vagar por aí como você disse, Tiago. Você viu como a doutora reagiu quando nos encontrou naquela sala. Porque eles mantém aqueles cadáveres lá? Dá pra fazer exame com sangue de defunto?
- Não faço ideia. Não lembro nem o nome da minha professora de Biologia. – brinco, sério.
Daniela se levanta e vai até a porta, olhando pela fresta.
- Vamos fugir daqui.
- O quê? – surpreendo-me.
- É isso que você ouviu, Tiago. Vamos fugir daqui. Onde estávamos indo quando saímos de Jaboticabal?
- Provavelmente pra São Paulo. Ou a cidade mais próxima que não estivesse destruída.
- Ok! Vamos pra São Paulo então. Mas antes precisamos fazer umas coisas. – e volta, falando baixo, como se as paredes tivessem ouvidos. – Vamos “dormir”. Quando vermos que está mais sossegado, vamos ao laboratório, pegamos uma amostra de sangue infectado e damos no pé.
- Pra quê a amostra? - pergunta Ricardo, confuso.
- Não sabemos o que é e nem o que podemos ganhar com isso.
Concordo com sua idéia, mas com outro propósito.
- E você acha que vai ser fácil? – desdenha o mais novo.
- Só saberemos tentando.
♦ ♦ ♦
Horas depois, estamos deitados esperando o momento apropriado. Como sumiram com nossas roupas desde que chegamos aqui, nos vestimos exatamente iguais. Camiseta e calça moletom brancas, descalços. Teremos que ir assim mesmo. Olhamo-nos ansiosos.
De repente, um tiro. Logo após, um grito.
Levantamos alertas.
Mais tiros e berros são ouvidos do outro lado da janela. Uma sirene toca por toda a base.
- O quê tá acontecendo agora? – grito.
- Será que eles chegaram aqui? – pergunta Ricardo, mais curioso do que assustado.
Correndo até a janela, abro-a lentamente. Vejo alguns dos soldados sobre outro, devorando-o. Outros estão caídos na terra. Ouço tiros do outro lado.
- Garotos! – Abigail aparece no quarto, com um revólver. – Venham comigo!
- O quê tá acontecendo? – pergunta Daniela.
- Não há tempo! Vamos!
A seguimos pelo corredor, onde um soldado nos escolta. Outro aparece na esquina adiante. Vendo-nos, grita em fúria, espirrando sangue em nossa direção. Ricardo corre pra trás de mim e Daniela recua. Abigail apenas engatilha a arma, mira e atira. Em cheio na testa. A parede é manchada de vermelho. Continuamos a marcha, agora mais rápidos.
- Tiago. – Daniela sussurra. – Não podemos sair daqui sem a amostra. Temos que dar um jeito de chegar ao laboratório.
Como andamos em uma fila indiana urgente, com o soldado na frente e Abigail logo em seguida, dou um sinal para Ricardo entrar na próxima porta. Assim que os dois viram o próximo corredor, corremos sorrateiros até a porta indicada e entramos. Após um minuto, como ninguém aparece, saímos e voltamos até o laboratório. Encostando a porta, ouvimos gritos se aproximando.
- Daniela! Temos que ser rápidos!
Em uma espécie de geladeira, encontramos algumas amostras de sangue. Nossos nomes as rotulam.
- Só há nosso sangue aqui!
- Procuram isso? – Abigail, já dentro da sala, bloqueia a porta. Há sangue espirrado em seu jaleco. Balança uma maleta pequena de metal em nossa direção. – Para quê iam pegar isso, garotos?
Nenhum de nós abre a boca.
- Acho que subestimei sua inteligência. Íamos exigir que mantivessem sigilo em relação ao ocorrido em suas cidades. Vocês seriam enviados até São Paulo, onde teriam um apartamento e empregos. Mas... – mira a arma em direção a Daniela. – desse modo é bem menos complicado.
Vejo-a pressionar o gatilho quando o soldado entra correndo, derrubando-a. O revólver cai e para bem aos pés de Daniela, que o pega num segundo.
- Tá tudo fodido lá fora, doutora! – grita o soldado, sem nem olhar pra gente. Foca toda sua atenção em bloquear a porta. – Parece que tinha um infectado dentro do porta-malas do carro onde eles vieram. Uma mulher. Um dos soldados abriu e foi atacado. Depois, foi pra cima dos outros. Esses filhos da mãe são muito rápidos.
Olho pra Ricardo, que concorda timidamente com a cabeça. Não parece arrependido, mas assustado.
Nesse meio tempo, Daniela manteve a arma direcionada à velha. Desviando um pouco, atira na nuca do soldado, que cai. Putz! Que sangue frio! O sangue espirra no rosto de Abigail, que não se abala.
- Me entrega as amostras! – ameaça Daniela, balançando a arma, firme.
- O que acha que vai conseguir com isso, garota? – pergunta a senhora, enquanto se aproxima devagar com a maleta estendida.
Após o segundo passo, a sala é invadida pelos zumbis. Daniela que vá pro inferno com suas definições! Chamo-os de zumbis e ponto final.
O ataque faz Abigail reagir e bater com a maleta na cabeça do primeiro que investe contra ela, caindo logo depois. Ela se arrasta ajoelhada bem rápida e some por trás do armário metálico.
- Vamos! Vamos! – grito, correndo até os fundos do laboratório. Nos trancamos a tempo na sala de trás.
- Que droga! Tenho que pegar as amostras! – pragueja Daniela.
- Não dá mais, Dani! A maleta abriu e derrubou tudo no chão. Peguei as amostras de nosso sangue, pelo menos. – explico. – Precisamos sair daqui!
No alto, há uma passagem de ar bem estreita, mas acho que dá pra passar. Subo no armário logo abaixo e retiro a grade que a bloqueia. Ajudo Ricardo a subir, que passa sem dificuldade. A próxima é Daniela, que estampa cólera em seus olhos. Também passa facilmente. Quando me apoio pra subir, ouço a porta atrás de mim escancarando-se. Mãos agarram meus pés descalços. Debato-me um pouco e consigo evitar uma possível mordida, chutando a cabeça do infeliz, sem nem olhar seu rosto. Com um impulso, chego do lado de fora, caindo de costas na terra.
- Rápido, Tiago! – ouço Ricardo me gritar, puxando-me pelo braço.
Andando próximos à parede, evitamos que eles nos vejam. Daniela corre na frente e detona a cabeça do soldado infectado que investe contra ela, surgindo de trás de um caminhão. Os miolos se espalham pela lataria do veículo. Ricardo e eu corremos quando ela some por detrás do mesmo. A avistamos subindo em um jipe e dando partida. Como essa garota tem sorte em sempre encontrar a chave certa no lugar certo. Subimos sem demora, e assim que o carro começa a andar, um deles se joga em Daniela, agarrando-a pelos cabelos.
- Mãe! – grita Ricardo, surpreso.
Daniela aumenta a velocidade tentando se livrar da mãe de Ricardo. Seus gritos são animalescos. O vestido claro manchado de sangue associado à pele branca e os cabelos longos e negros fazem-na parecer um fantasma oriental. Ela consegue entrar por completo no jipe, ganhando vantagem sobre Daniela, que a mantém afastada com uma mão e com a outra segura o volante. Agarro-me à borda do veículo, quase escorregando devido às ziguezagueadas do carro desgovernado. Quando consigo me manter firme, vejo Ricardo segurando um fuzil.
- Desculpa, mãe!
E atira. Certeiro. A japonesa solta o cabelo de Daniela e cai, rolando uns bons metros pelo asfalto. Mas não levanta. Permanecemos alguns minutos em silêncio enquanto Daniela sai da base e segue rumo à estrada. Quando o lugar some por trás das árvores, Ricardo me olha por um instante.
- Quando vocês estavam dormindo na sala de casa, eu abri a porta do porão e quando minha mãe saiu, a abati. Depois, arrastei-a pra fora e a amarrei com uns lenços dentro do porta-malas. Por isso fiz aquele barulho todo na viagem; caso ela acordasse, vocês não a ouviriam. Ela deve ter conseguido se soltar.
- Tudo bem. – consolo.
- Achei que pudesse curá-la. – diz ele, com uma expressão de desapontamento. - Mas acho que isso não tem cura.
Então, Daniela diz algo que me faz lembrar a pessoa boa e amiga que ela se mostrou quando a conheci. Apenas olha Ricardo pelo retrovisor e sorri.
- Obrigada.
.
18 mordidas:
ta ficando melhor...
30 de agosto de 2008 às 23:32coloca logo a continuação to super curiosa!
porra
1 de setembro de 2008 às 19:41QUE FILHO DA PUTAAAAAAAAAAA!!
odeio esses personagens teimosos
Ricardo duplamente insistente
tomara que morra, só sabe atrapalhar! affe
Tá ficando muito bom.
5 de setembro de 2008 às 17:44Pegou jeito.
Posta logo a continuação, quero saber o que vai acontecer.
Ricardo só faz besteira ._. ... Ferrou com a vida de todo mundo xDDD... Bem, vendo pelo lado bom, o que aconteceu no anterior era só um sonho, vendo pelo lado ruim, Ricardo ferrou com a vida de todo mundo xP.
16 de setembro de 2008 às 03:59Nossa por alguns seguntos pensei que Daniela ia marta os seus amigos.
1 de outubro de 2008 às 19:44E o Ricardo so faz merda!
Ricardo japa de pinto piqueno -.-
19 de dezembro de 2008 às 23:55Esse japa -.-
30 de dezembro de 2008 às 06:37SUHAEHSAHUESHUAEHE
Japones filho da puta!! Se não tivesse levado a mãe, estaria tudo bem e eles iriam viver em SP como se nada tivesse acontecido.. Agora eles num tem nem mais comida XD
17 de fevereiro de 2009 às 05:43iam leva eles pra sp coisa nenhuma, pra mim iam mata eles ou sei la o q. pra ninguem sabe de nada
17 de fevereiro de 2009 às 17:01Esse Ricardo é uma merd@
18 de fevereiro de 2009 às 23:36Pô deixa a mae dele infectar todo mundo e depois desiste dela.
Affz
Pô, se o Ricardo não tivesse levado a mãe não teria mais história... iriam viver lá em São Paulo... Valeu Ricardo!!! Isso aí japinha!!!
20 de maio de 2009 às 18:12Se for ver ainda bem que ele trouxe a mãe dele, ajudou na fuga.
13 de julho de 2009 às 17:27O problema é que agora o resto do Brasil/São Paulo vai começar a infectar.
Vai que a enfermeira estava mentindo quanto ao apartamento e trabalho.
Agora está interessante, os personagens mostram suas verdadeiras personalidades. Ta certo q pra mim são todos uns filhos da mãe calculistas, mas enquanto estiverem de acordo.... ninguem morre. (ainda)
6 de março de 2010 às 16:44uhuuuuuuu bala na mae
6 de outubro de 2010 às 13:37O ser humano nao reage bem sobre preçao mas esse garoto Ricardo
6 de fevereiro de 2011 às 18:51rum reagiu MUITO BEM com a PREÇAO
Sejam bem-vindos novos infectados, e aos antigos, espero que continuem sobrevivendo.
6 de julho de 2012 às 23:46Grande abraço!
Muito legal estou adorando kk
14 de novembro de 2012 às 15:56Gente, culpa do Ricardo pq ?
10 de janeiro de 2013 às 00:20Postar um comentário