Capítulo 8 - Como tudo começou



O relógio do microondas marcava exatas duas da manhã. Acabara de desligar os freezers e todas as tomadas do depósito e da cozinha. Chegando á padaria, encontrei com minha amiga Juliana me esperando, após fechar o caixa. Saímos da loja de conveniência exaustos. Mais uma sexta-feira de trabalho. Era muito cansativo ralar até aquele horário. Quando ela abriu a porta que levava ao escritório no segundo andar, vi que não tinha pressa em chegar em casa, e decidi subir com ela. Depois, pegaria minha bike e ia embora.
Subindo a escadaria, fui escutando-a se queixar de sua vida, sobre o processo que seu ex-marido entrou pra pegar a guarda de sua filhinha, sobre não conseguir um emprego melhor. Por um momento, me arrependi de não ter ido embora.

Chegando ao corredor onde ficava o cofre, ela foi logo guardando o dinheiro, sem parar de reclamar. Assim que terminou, voltei com ela, mas não antes de pegar a chave que ela esquecera sem perceber sobre o cofre. Enfim, não foi tão ruim escutá-la amaldiçoar sua existência naqueles longos minutos. Coloquei a chave disfarçadamente no bolso da calça e desci com ela. Assim que saímos, vimos que nosso patrão voltara. O que ele estava fazendo no posto uma hora dessas? E se ele pedisse a chave?

Procurando-o, o vimos abaixado perto da bomba de gasolina.

- Sr. João? – chamou Juliana, trancando a porta.

Fui direto pra onde minha bicicleta estava presa enquanto Juliana foi até ele. Passando perto dele, mesmo com a escuridão, pude perceber uma poça de sangue no chão. O sangue do vigia noturno. Sangue tirado á mordidas do meu patrão.

- Puta que pariu! – gritei, trombando no pilar próximo. – Juliana, não chega perto dele!

Juliana me olhou sem entender nada no momento em que o velho virou em minha direção. Assim que avançou, grunhindo, me joguei pro outro lado, fazendo-o capotar sobre a bicicleta.

- Corre! – gritei.

Peguei Juliana pelo braço e a arrastei até a porta do escritório.

- Vai! Abre essa porta!

- Calma! – disse ela, ainda confusa. – O quê deu nele?

- Sei lá! Só vi sangue ali!

Juliana estava tendo dificuldade em encaixar a chave, trêmula. O berro de raiva do Sr. João nos fez olhar assustados pra trás. Ele estava vindo, e rápido.

- Meu Deus do céu! Abre logo essa porta!

- Calma!

- Calma o caralho! Vai! – ele estava bem perto.

Quando ouvi a porta destravar, a abri num empurrão e entrei ligeiro, puxando Juliana. A bati logo atrás, mas o maluco fora mais rápido, se jogando contra nós. Juliana gritou, batendo contra a parede. Engalfinhei-me com ele, mantendo sua boca longe. Parecia querer me morder. Que diabos estava acontecendo?

Juliana puxou-o pela camisa e o jogou do lado de fora, que caiu de joelhos.

- Vamos! Não dá tempo de fechar a porta! – puxei-a novamente pelo braço escadaria acima, não sem antes ter a impressão de ter visto mais vultos no fim da rua.

Chegamos ao corredor do cofre, onde ela abriu a porta do escritório. Os grunhidos se aproximavam. Conseguimos ser mais rápidos dessa vez, batendo a porta e trancando-a. Mas pelo jeito não iria durar muito, pois ele começou a se debater contra ela. A madeira era fraca.

- Vem, Jú!

Corremos e abrimos a janela. Era bem alto dali até o chão.

- Você tá louco? – falou ela. – Eu nunca vou pular daí!

- Mas ele vai entrar! É a única saída!

- Não, Tiago!

O estrondo nos assustou. A porta tinha ido chão abaixo. Quando o vimos adentrando o escritório, com sangue na boca e camisa, não pensei duas vezes. Apoiei-me no parapeito e, no momento em que ia colocar minha perna pra fora, ele se jogou contra Juliana, que desequilibrou e trombou em mim. Sem conseguir me segurar, caí e senti um forte baque na cabeça.


♦ ♦ ♦



A iluminação forte machuca meus olhos assim que os abro. Acostumando-me, forço um pouco a vista e vejo Ricardo sentado na cama ao meu lado. Parece que estava me esperando acordar, pois sorri. Olho pro outro lado, onde Daniela está em outra cama, inconsciente. Levanto-me com dificuldade.

Que roupas são essas?

Vestimos camisolas brancas e, eu pelo menos, nada por baixo. Há um esparadrapo em meu braço, com uma pequena mancha de sangue. Sinto-me limpo, diferente de quando estava fugindo dos monstros. Tomar banho era algo impossível. Num estalo, me lembro do que houve.

Assim que chegamos á tal base, os soldados nos pegaram e nos levaram até um galpão, onde nos despiram e ligaram mangueiras contra nós. A pressão da água era tão forte que chegava a machucar. Tentamos nos proteger, mas eles não tinham piedade. Estranhos protegidos com um uniforme especial nos pegaram e nos esfregaram com buchas amarelas. Olho meu braço e noto algumas partes levemente esfoladas. Daniela até tentou se livrar deles, mas um dos soldados bateu com a arma na cabeça dela, que desmaiou. Já sem forças, acho que desmaiei também. O esparadrapo me faz imaginar que devem ter feito exames de sangue na gente.

- Você está bem? – pergunta Ricardo, me olhando, curioso.

- Acho que sim. – respondo, ainda zonzo. – Que lugar é esse?

- Não sei. Acho que é uma base militar. Mas não sabia que existia uma tão perto da cidade. Deve ficar em algum lugar secreto.

- Ou foi construída há pouco tempo, especialmente pra ocasião. – diz Daniela.

Viro-me e a vejo se levantando, com dificuldade, passando a mão na testa, que exibe um curativo.

- Como assim?

- Eles devem ter construído esse lugar assim que tudo começou. Devem saber exatamente o que está acontecendo. Caso contrário, não teriam nos tratado daquela forma. Parecia que éramos animais.

- Eu acho que fizeram isso como medida de segurança. – diz Ricardo, sem olhar pra ela. – Não há como saberem quem está infectado ou não.

- Claro que há! – discute Daniela. – Era só olhar se fomos mordidos.

- Eles não lutaram pra sobreviver no meio dos zumbis como nós. – rebate Ricardo, agora a encarando. – E talvez não seja só pelas mordidas que eles transmitem a loucura. Como podemos saber ao certo? Não sabemos nem como tudo começou. Não sabemos se é um vírus, uma infecção, uma experiência que deu errado. Não sabemos porra nenhuma!

O clima fica tenso entre eles.

- Bom – começo, tentando amenizar a situação. -, percebi que uma barricada se estendia ao redor da cidade. Pelo jeito eles conteram o acontecido e evitaram que outras cidades fossem destruídas.

- Não foi bem assim que aconteceu. – uma voz nos chama atenção.

Na porta dupla adiante, uma senhora já nos seus cinqüenta anos nos observa, com as mãos dentro dos bolsos de seu jaleco branco. Tem cabelo grisalho curto e usa óculos finos. Seu colar dourado brilha devido a lâmpada fluorescente do cômodo, terminando num estranho instrumento pendurado, semelhante a uma pequena flauta. Apesar da idade aparente, sua pele é bem conservada.

- Sou a Dra. Abigail, prazer. – nenhum de nós responde. – Desculpem pelas medidas tomadas á pouco, mas vocês são os primeiros sobreviventes que encontramos. E a respeito de termos evitado que outras cidades fossem contaminadas, receio ter que discordar. Quando começou, os infectados vieram pela estrada e chegaram a algumas cidades do interior paulista. Jaboticabal não foi a única, mas foi a primeira.

- Mas o quê diabos aconteceu? – pergunta Daniela.

Vendo-nos esperando uma explicação, Abigail se aproxima, fazendo o som de seu salto ecoar pelo quarto, e senta em uma cama próxima.

- Tudo começou na UNESP, Universidade Estadual Paulista, conhecida por possuir os melhores veterinários do país. Estavam estudando um vírus em um cão, que era transmitido através do sangue. Até aí, nenhuma novidade. Acontece que esse vírus, na verdade, era provocado por um parasita microscópico que se multiplicava em contato com a corrente sanguínea. Multiplicando-se, ia direto ao cérebro do animal e fazia-o perder o controle sobre suas ações. Eram dominados por um tipo de Raiva, mas mais potente e muito mais agressiva. Atacavam quem se aproximasse. Descobriram isso tudo após colher uma amostra do sangue do cão e injetá-lo em alguns ratos. Os que foram submetidos ao teste atacaram os outros como se fossem carnívoros, canibais, comendo outros de sua espécie. O Dr. Emerson, encarregado pelo setor de viroses, ao tentar pegar um deles na gaiola, foi mordido superficialmente. Continuou com sua pesquisa, até que começou a sentir-se mal. Foi até a enfermaria fazer um curativo e descansar. Lá, atacou a enfermeira. Depois, vagou pela Universidade atacando quem aparecesse em seu caminho. Foi tudo muito rápido. Parece que, quanto maior for o ferimento provocado por um deles, mais rápido é o contágio. Uma vez na corrente sanguínea, não há cura. Pelo menos, não ainda.

- Como você sabe com tanta exatidão o que aconteceu lá? – pergunta Ricardo, interessado.

- Eu estava lá com o Doutor - responde a senhora, com olhar distante. – Quando vi uns matando aos outros pela janela do laboratório, tranquei a porta e apaguei as luzes. Mantive-me escondida por um bom tempo, pois não havia telefone por perto. Acho que fiquei no laboratório durante uns dois dias. Quando consegui sair e usar o telefone no escritório, a cidade havia sido dizimada. Um carro do exército veio me buscar e me levou á Capital. Pelo caminho, vi que as cidades possuíam barricadas em suas entradas. Não vi uma única cidade sem proteção. Eles eram muito rápidos. Em menos de dois dias destruíram tudo. Levei uma amostra do sangue comigo e pesquisamos mais sobre ele. Parecia se adaptar em qualquer organismo, tanto animal como humano. Bastava ter um cérebro para ser dominado. Por sorte, os animais eram mais rápidos pra fugir. Muitos foram pegos, mas foram pro mato. Pareciam querer caçar seus semelhantes, mas isso não significa que não atacassem humanos. O faziam, e com uma voracidade incrível. Na UNESP, os soldados mataram muitos deles. Foi uma carnificina.

- Não há cura então? – questiona Ricardo, desanimado.

- Por enquanto não, pois não conseguimos muito sucesso nas pesquisas. É algo realmente novo. Nenhum caso desse vírus foi registrado até hoje. Ninguém sabe como aquele cachorro o pegou. Era o cão de uma família que morava em uma fazenda. O cão começou a atacar os outros animais da fazenda, que foram mortos pelo próprio dono. Ele prendeu o bicho e nos chamou. Não sei se teria sido possível realizar os testes com o cachorro morto.

- Nenhuma cidade escapou? – pergunta Daniela, mais calma. – Araraquara?

- Não, sinto muito. As cidades próximas foram todas devastadas. – ouvindo isso, noto os olhos de Daniela se enchendo de lágrimas. – Tenho essa lista das cidades atacadas.

Dra. Abigail tira um pedaço de papel do bolso e nos entrega. Vinte e uma cidades constam na lista. As que ficam próximas da Capital continuam inteiras.

- Gostaria que vocês respondessem algumas perguntas sobre os infectados, já que estavam no meio deles. Seria de grande ajuda.

Somos levados a uma sala com uma mesa de metal. Lá, um homem gordo e baixo nos faz várias perguntas. Onde estávamos quando tudo começou, como conseguimos sobreviver, como eram os infectados em contato com humanos sãos, se vimos algum outro sobrevivente, se matamos algum e como o fizemos. Enfim, o interrogatório é maçante.

De volta ao quarto, encontramos três bandejas com comida e suco. Devoramos tudo em questão de minutos. Dra. Abigail aparece outra vez.

- Bom, meus jovens. Vocês permanecerão aqui por algum tempo para que possamos examiná-los mais. Não sabemos qual o grau de infecção, caso tenham mesmo sido infectados. Como eu disse, o parasita se adapta para sobreviver. Espero que compreendam.

Não temos escolha pelo jeito.


♦ ♦ ♦



Mais tarde, deitados, não conseguimos pegar no sono.

- O quê vocês acham que eles farão com a gente? – pergunta Ricardo, sentado na cama.

- Exames de sangue, eu acho. – respondo, deitado.

- Já fizeram exames. Acho que não sou o único que tem uma picada de agulha no braço. Quero dizer, o quê farão depois dos exames? Pra onde nos mandarão?

- Não faço idéia, cara.

- Pois eu não estou gostando nada disso. – sussurra Daniela. Parece querer evitar que alguém nos escute.

- Como assim?

- Não sei se vocês notaram, mas a Doutora estava cochichando com o Sargento que nos trouxe pra cá quando entramos na sala do interrogatório. Nos olhava com suspeita. Não gostei nada da expressão dos dois.

- Aonde você quer chegar com isso, Daniela? – pergunto, desconfiado.

- Não sei. Sinceramente. Mas sei que estão escondendo algo.

- O quê eles esconderiam da gente?

- Se eu soubesse...

Daniela mudou muito depois que fugimos da gangue do Amarelo. Não a vi sorrindo desde então. Não foi tão receptiva com Ricardo como fora comigo. Seu olhar estava diferente. Parecia não confiar mais em ninguém. Espero que ela melhore. Não a culpo.

Meus olhos começam a pesar. Após algumas fisgadas, me entrego ao cansaço.


♦ ♦ ♦



Um tiro me faz pular da cama. Olho pros lados e não vejo nada. Pela porta entreaberta, ouço passos. Cautelosamente vou até ela e olho pelo corredor.

Daniela está de costas. Sangue escorre por entre suas pernas.

- Sua maluca! Não faz isso! – implora Ricardo.

O quê?

Quando ela dá um passo lateral, vejo Ricardo rastejando pelo chão, com a perna machucada. Um rastro de sangue o segue. Daniela aponta uma arma pra ele.

- Não tenho escolha, moleque.

E dá o tiro fatal.

Bato a porta do quarto, e puxo uma cama para bloqueá-la. Corro até as janelas, mas estão trancadas.

- Abre essa porta, Tiago! – grita Daniela, se jogando contra a mesma. A cama não vai segurá-la por muito tempo.

Com um chute, consigo quebrar a janela, abrindo-a sem dificuldade. Do lado de fora, vejo uma multidão de zumbis logo abaixo. Droga!

- Tiago.

Olho e vejo Daniela já dentro do quarto, apontando o revólver em minha direção.

- Você ficou doida?

- Desculpa, mas só assim eu vou conseguir sobreviver.

O tiro me pega em cheio no ombro. Desequilibrando-me, caio em direção aos zumbis.

 
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22 mordidas:

Thaís V. Manfrini disse...

Ohmygod!

28 de agosto de 2008 às 18:48
Lauro disse...

Posta o próximo capitulo com urgencia!

28 de agosto de 2008 às 21:09
Unknown disse...

shit! a daniela está louca ou o que?

28 de agosto de 2008 às 23:01
Taty disse...

Nossa o q deu nessa garota???
mata ela logo...

30 de agosto de 2008 às 23:17
Juão disse...

Oo




curioso demais!

1 de setembro de 2008 às 19:30
Anônimo disse...

Daniela... Endoideceu ou é impressão? o_O...

16 de setembro de 2008 às 03:47
Unknown disse...

CARALHOO

30 de dezembro de 2008 às 06:16
Carol =D disse...

OO

9 de janeiro de 2009 às 01:29
Tayná Tavares disse...

imagino que essa última parte tenha sido uma alucinação.. assim espero pelo menos.. O_O

17 de fevereiro de 2009 às 05:36
Bodones disse...

VACA, PQP BOTA DUENTE

17 de fevereiro de 2009 às 16:37
Anônimo disse...

Caraka mano to doido pra ve oq acontece

Muito loko

18 de fevereiro de 2009 às 23:21
fernandopp disse...

cara , eu pensei q essa menina fosse normal e q iria atrapalhar o Tiago, mas eu acho q ela é lokaaaa

20 de fevereiro de 2009 às 00:01
ErickTavarez disse...

Do caralh* essa Daniela. No extras até que ela é "foda" mas... Bom. Vamo ver.

13 de julho de 2009 às 17:14
Brunno Fagundes disse...

Ahhhhh morrendooo x_x
Muitoo bom nuss

26 de agosto de 2009 às 14:37
Silas disse...

Será que ninguém percebeu que isso foi um sonho?

16 de setembro de 2009 às 05:21
Unknown disse...

Karaleo

iuAHEuahehAUheuhauieh

EU MORO EM JABOTICABAL XD

70 mil habitantes infectados \o/

17 de outubro de 2009 às 20:32
~Lobo disse...

Filha da .... Mudando de assun to.... Araçatuba já era também?

6 de março de 2010 às 16:19
mizzz³ disse...

Algo me diz que o vírus deu uma mudada no guarda-roupa ou ela ficou paranóica esquizóide mesmo xDDDD
Gogogogo Dani kill them all!!

7 de novembro de 2010 às 18:15
Unknown disse...

Simplesmenti ESPETACULAR !

6 de fevereiro de 2011 às 18:31
Tiago Toy disse...

Galera pirando com as loucuras da Dani, rs.

Sejam bem-vindos novos infectados, e aos antigos, espero que continuem sobrevivendo.

Grande abraço!

6 de julho de 2012 às 23:45
Priscila Monteiro disse...

Omg, o que deu nela ? Muito bom o livro!!!!!!

9 de janeiro de 2013 às 23:50
dinossauro71 disse...

Poooooooooooooowww... daniela ficou malvada...(no consigo mais dormir,durmo com um olho aberto e o outro fechado que nem no livro tenho medo de algum infectado parecer agora)

22 de março de 2013 às 10:39

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