5 pecados na arte de contar histórias



Pecar em ser uma versão piorada de um autor famoso. É válido analisar como eles constroem suas cenas e descobrir como conseguem mostrar ao invés de contar, mas encontre sua própria voz, seu estilo, e os coloque em uso em seu trabalho. Do mesmo jeito que você não deveria querer plagiar o trabalho de alguém, também não deveria, sem querer querendo, "roubar" o estilo ou voz de alguém. Isso é péssimo por dois motivos: primeiro porque leitores vão notar a imitação e não gostarão nadinha; segundo porque você estará perdendo a parte mais gostosa de se tornar um escritor.

Pecar em diálogos empolados. Não faça "Minha mãe, Maria Aldegunda, ficaria muito feliz em vir à sua casa para o jantar, tio Dezêncio". Faça "Mamãe adoraria vir jantar, obrigado". Entendeu? Leia seu diálogo em voz alta. Se você estiver tropeçando nas palavras que seus personagens estão falando, é hora de revisar. Nem muito formal, nem informal demais. Estude o modo como todo o tipo de gente fala, desde oradores e médicos a engraxates e motoboys. Todos são personagens reais com suas falas reais.

Pecar fazendo nada acontecer. Se um personagem pega o carro e o leva para trocar óleo e nenhum evento importante ou interação ocorre, você pode e deve apenas resumir a cena: "Troquei o óleo pela manhã antes de ir à farmácia e à lavanderia". Ou ignore-a. Cada aspecto do dia não merece um maior desenvolvimento se não agrega nenhuma informação reveladora sobre o personagem ou a história. Não roteirize um episódio do Big Brother.

Pecar com problemas de credibilidade. Ou, se preferir, erros de continuidade. É quando uma cena contradiz outra. Se você tem uma mãe com três crianças em uma cena, e em outra a mesma mãe surge com sete crianças, apenas seis meses depois, há um problema de credibilidade (ou um sério caso de Síndrome de Angelina Jolie). Em um nível menos obvio, um exemplo seria quando crianças são extraordinariamente
sábias ou sempre mais inteligentes do que seus pais, como algumas crianças de sitcoms norte americanos conversam com a esperteza irônica de Jô Soares.

Pecar em cenas sentimentais. Há diferença entre sentimento e sentimental. Imagine açúcar e adoçante. Cenas sentimentais são tão superficiais quanto um vidro de Zero Cal. Elas tentam manipular a emoção do leitor, geralmente apelando para a piedade, nostalgia ou sentimentos mornos e distorcidos. Entenda, eu não sou contra uma cena mostrando ou provocando emoção a quem lê. Sou contra falsos sentimentos, emoção forçada. Se os personagens estão experimentando acentuadas emoções, mas você não, o escritor o deixou de fora por não mostrar as emoções de modo convincente.



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2 mordidas:

Anônimo disse...

Muito bom, Tiago Toy! Concordo com tudo, em gênero e número. Acrescentaria apenas mais um: pecar em deixar tudo óbvio demais. Palavras como dor, amor, desprezo, tristeza, revelam muito menos em um texto do que descricoes que coloquem estes sentimentos como palpáveis. Muito melhor do que "ele andava triste" seria dizer "ele andava encurvado e cabisbaixo, como quem acabara de perder seu animal de estimacao"...

19 de maio de 2013 às 03:34
Unknown disse...

Ótimo Texto, Tiago! Pontos muito importantes a serem observados, não apenas por autores iniciantes, como pelos mais experientes, porque ninguém está livre de cometer um pecadinho desses de vez em quando.

Um dos "pecados" literários que eu já vi muito e que vale ser citado é o excesso de palavreado difícil, as frases abusivamente complicadas, aquela escrita demasiadamente rebuscada, que faz com que a maioria dos leitores precise recorrer ao dicionário a cada parágrafo; enfim, o tal do "escrever difícil". Claro que o uso de palavras e construções frasais diferenciadas, que não costumamos utilizar na linguagem falada, torna a leitora mais rica, mas o excesso disso é que faz com que a leitura fique chata. Se mal utilizadas, tais palavras/frases são capazes até mesmo de entregar que o próprio autor escreveu o livro (ou conto, que seja) com um dicionário do lado.

É óbvio que a leitura deve ser uma experiência enriquecedora para o leitor, capaz de acrescentar algo novo ao que ele já tem assimilado, mas, junto a isso, deve ser também fluida, clara, gostosa. Na minha opinião, o correto seria encontrar uma dosagem equilibrada para o uso desse tipo de linguagem, que não deixaria a escrita parecer forçada demais:))

19 de maio de 2013 às 07:14

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